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O colar de Catherine

O colar de Catherine

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O colar de Catherine

8 de Setembro de 1997

I - Liam McGuire
8:11AM

Eu nunca fui muito para política. Nunca tive grande interesse em servir pela pátria ou em qualquer lado em que devo ser leal. A única coisa que me interessa é lutar porque, quando estou a lutar, é o único tempo em que sinto que tenho um propósito e, por agora, tenho motivo para lutar. Eu posso lutar pelo meu país, pela minha versão de nacionalismo e pátria, tenho o Real Exército Republicano Irlandês. O grupo que luta pela liberdade da Irlanda do Norte, e que é considerado radical, mas ainda serve bem os meus objectivos e serve o grupo bem.

Eu estou em frente desta casa na rua de Ballygomartin, sentada no parque de Woodvale à espera do John McDonnell, um político inglês proeminente desta região que está a fazer discursos contra o RERI. Ele está a ficar um incómodo para o grupo, então mandaram-me pôr uma bomba debaixo do carro privado dele que está montado para explodir quando ele der à chave na porta do lado do condutor. Não gosto muito da ideia de matar alguém, mas é necessário para ensinar estes políticos da Inglaterra que não são eles que mandam em nós, mas somos nós, o povo da Irlanda, que manda no que acontece em Belfast. Já estamos em 1997! Dentro de pouco tempo, vai começar um novo milénio, esta imperialista colonização e este assédio dos católicos devia ter acabado há anos atrás. A governação de Irlanda devia dar ao povo da Irlanda. Esta ocupação inglesa é uma das grandes injustiças do século vinte e é insuportável. Por isso é que eu luto com o RERI…

Vejo alguém a abrir a porta... é uma rapariga nova… ninguém disse nada sobre uma rapariga, ela está à espera perto da porta… deve ser a filha dele…

II - Catherine McDonnell
8:13AM

Eu não sei porque é que o pai insiste em ficar aqui na Irlanda, fomos mudados de Londres para aqui apenas há um ano atrás e desde que nós chegamos aqui não tenho nenhum lado aonde possa ir. O pai só fala contra o RERI, e que a Inglaterra tem uma posição superior à da Irlanda e, como ingleses, devemos estar na Irlanda. Eu sei que tudo o que o meu pai diz não é um ponto de vista popular com as minhas colegas ou com os pais delas e é por isso que já tive de mudar de escola três vezes, por causa da perseguição. Vamos ver quanto tempo eu vou ficar no Santo Domínico… Nunca começa mal, mas as coisas mudam sempre quando descobrem quem é o meu pai. Eu tenho medo de ficar aqui quando há tanta tensão entre os ingleses e os irlandeses. Tenho medo daquilo que possa acontecer se nós ficarmos aqui.

Ai! Já são 8:15! A nossa reunião com a minha nova diretora da escola, Irmã Lucina Montague, começa às 8:45, e eu não quero chegar tarde!

  • Oh Papá! Vamos! Eras tu que querias falar com a mulher e agora sou eu que estou a ir atrás de ti para sair! Eu quero falar com ela sobre entrar na peça de teatro “Escola por Escândalo”, se eu chegar tarde não sei se ela vai querer ajudar-me!
  • Espera dentro do carro, venho já!
  • ‘Tá bem.

Oh! O que foi esse barulho? Parecia um rapaz a gritar qualquer coisa, deve ser uma das equipas de futebol que pratica de manhã.

  • Oh Papá, posso pelo menos pôr o carro a trabalhar?
  • Claro que sim! As chaves estão em cima da mesa!

Que fixe, o pai nunca me deixa tocar no carro, agora tenho de ir à procura das chaves.

III - Liam McGuire
8: 17AM

Que bom! A rapariga voltou a entrar dentro de casa. Por um pouco ela estava a gritar qualquer coisa ao fundo das escadas, não tenho a certeza do que eles estavam a falar, mas estou agradecido por ela ter regressado. Quando ela tocou no carro, não pude controlar o grito que saiu da minha boca. Essa rapariguinha não é o nosso alvo, é o pai dela. Mais eu estou surpreendido que ninguém me contou que ele vivia com a filha, ou que era possível que ela estivesse em casa com ele. É possível que o grupo saiba que ela vivia com o pai, mas não disseram nada porque sabiam que eu não ia suportar isto? …Não… Não, o RERI não ia matar ninguém inocente de propósito, às vezes inocentes morrem por acidente, mas nunca de propósito…Porra, ela está a sair outra vez com as chaves do carro e vai de volta do carro… Não, não, não ponhas a chave na porta!

III - BOOM!
8:18AM

-NÃO!

Foi o grito que fez a Catherine virar o corpo inteiro e inadvertidamente fê-la virar a chave na porta. Foi só por um segundo que os olhos do Liam e da Catherine estabeleceram contacto.

O Liam observou que esta rapariga não podia ter mais do que 16 ou 17 anos, pela farda de Santo Domínico que usava, com cabelo curto, cor de fogo à volta da cara, colar de ouro ao pescoço. O que a Catherine viu foi um rapaz com cara de jovem, pouco mais velho do que ela. Com olhos grandes e verdes, cabelo encaracolado, castanho e curto. Estava vestido de só calças de ganga e uma camisola preta. Ele até foi um rapaz atrativo. A última coisa que a Catherine viu foi esses olhos verdes do Liam…

BOOM.

Com a força da explosão, o Liam bateu contra a cerca e ficou com o corpo inteiro queimado. Não conseguia ouvir a confusão à sua volta. A única coisa que ele ainda conseguia ver era o brilho do colar da Catherine. Com muita dificuldade, o Liam levantou-se e apanhou o colar que ainda estava a ferver, até queimava a mão, e apertou até tudo ficar preto.

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